Por Diogo Pitta
Machado de Assis, em "O velho Senado", publicado em
1898, traça como que um prelúdio do que viria a ser a política de hoje, sob as
botas moralmente asfixiantes da República, este golpe militar com o qual o
Brasil foi duramente ferido em 1889. Neste conto, o Bruxo do Cosme Velho
fala-nos, como que entre um gole e outro de chá, sobre o quão virtuoso era o
Senado na década de 60 do século XIX. Depois de expôr as virtudes dos políticos
e do Senado à época, Machado de Assis faz um paralelo daqueles políticos com os
de sua época, ou seja, após a Proclamação da República. E termina assim seu
conto admirável:
E após ele vieram outros,
e ainda outros, Sapucaí, Maranguape, Itaúna, e outros mais, até que se
confundiram todos e desapareceu tudo, coisas e pessoas, como sucede às visões.
Pareceu-me vê-los enfiar por um corredor escuro, cuja porta era fechada por um
homem de capa preta, meias de seda preta, calções pretos e sapatos de fivela.
Este era nada menos que o próprio porteiro do Senado, vestido segundo as praxes
do tempo, nos dias de abertura e encerramento da assembléia geral. Quanta coisa
obsoleta! Alguém ainda quis obstar à ação do porteiro, mas tinha o gesto tão
cansado e vagaroso que não alcançou nada; aquele deu volta à chave, envolveu-se
na capa, saiu por uma das janelas e esvaiu-se no ar, a caminho de algum
cemitério, provavelmente. Se valesse a pena saber o nome do cemitério, iria eu
catá-lo, mas não vale; todos os cemitérios se parecem. (1)
Assumo a audácia de interpretar esta passagem final do conto do grande
Machado de Assis: a República enterrou de uma vez os valores construídos com
esmero por uma tradição feliz, na qual os homens eram felizes por serem
virtuosos, e por que com estas virtudes, serviam ao bem comum, finalidade da
política. Aquele período felicíssimo da Nação, onde mesmo com as dificuldades
inerentes à raça humana os homens eram felizes, e onde escravos foram
verdadeiramente libertos, foi forçosamente enfiado neste corredor
metaforicamente citado por Machado de Assis, e com o tempo e a ideologia
fazendo o papel do porteiro "vestido segundo as praxes do tempo", é
trancafiado no corredor abstruso da história.
Hoje não é dia para comemorações. Antes de um feriado cujo
objetivo é festejar a instituição golpesca de um regime político, hoje deveria
ser o dia propício para a reflexão profunda sobre para onde estamos caminhando
a passos largos. Estamos, enquanto República, caminhando a galopes para o brejo
político, se lá já não estamos. Certamente dar-me-ão a alcunha de dramático.
Mas para dirimir dúvidas que porventura possam haver sobre a minha constatação,
basta, num esforço do intelecto, pôr-se imaginariamente fora do tempo e do
espaço, e contemplar de cima, todas as desastrosas primaveras pelas quais
passou, aos trancos e barrancos, a República. Em 127 anos, a República do
Brasil produziu golpes atrás de golpes, ditaduras, revoluções, presidentes
depostos, escândalos de corrupção clamorosos, uma inflação partidária nunca
vista na história do mundo, o que gera lutas partidárias cuja amoralidade faria
corar de vergonha o mais vil dos homens.
A instituição da República, na verdade, foi um golpe; diria até, a
Mãe de todos os golpes! O Quinze de Novembro, na verdade, é a data onde
lembramos pesarosos a largada para o início da derrocada moral e política do
Brasil. Neste dia lembramos, enlutados, o dia em que o maior estadista que esta
nação já conheceu, Dom Pedro II, foi expulso desta com toda a sua família. Dom
Pedro II foi talvez o homem que mais amou o Brasil. Causa-nos tristeza ( a nós,
Monarquistas) ver a indiferença e até mesmo o escárnio com o qual a maioria da
população trata os nossos grandes e verdadeiros heróis.
Se os políticos hodiernos cultivassem as virtudes que possuía -
por que as cultivava - Dom Pedro II, talvez o Brasil pudesse erigir-se desta
areia movediça na qual foi lançado após o Golpe de 1889, perpetrado por um
horda de bandidos, capitaneados por Marechal Deodoro da Fonseca.
Esta junta de facínoras políticos promoveu, no curso da história,
uma ruptura com o regime político que alçou o Brasil a um excelso patamar de
prosperidades econômicas, morais, políticas, e com isto fez do Brasil uma
grande potência. Sim o Brasil já foi uma grande potência.
Para não romper o luto, limito-me a estas palavras. E como
monarquista, digo que o que nos resta é estudar, rezar, lutar pela volta da
Monarquia (mesmo que eu não esteja vivo para vê-la) e - por que não? -, ouvir
um Réquiem, na certeza de uma vindoura ressurreição.
Viva a Monarquia!
Notas:
1 - Obra
Completa, Machado de Assis, Rio de Janeiro: Nova Aguilar, V.II, 1994. Publicado
originalmente em Revista Brasileira, Rio de Janeiro, 1898.
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